A compreensão de
Indústria Cultural pode-se partir da ideia dada de industrialização da cultura,
ou seja, a cultura como um processo de desenvolvimento contínuo, acelerado e
repetitivo para compra e venda e para atender (e criar) uma demanda de marcado.
Se entendermos o papel fundamental da Revolução Industrial para o modelo
socioeconômico capitalista, rédeas da atual sociedade mundializada, se faz
possível uma compreensão mais larga sobre este conceito para a cultura. E se,
segundo a sociologia, cultura é tudo que o ser humano constrói, reproduz e
reforça de geração em geração, por meio de comportamentos, ações, relações que
caracterizam uma sociedade, torna-se possível entender que há então, na
proposta de Indústria Cultural, uma otimização do processo de produção de
cultura. Como se fosse necessário acelerar as produções culturais,
característica especificamente humana.
Neste acelerar de
produções culturais, não é possível acelerar gerações. Para que a cultura se
defina enquanto característica de um povo, são necessárias gerações que
fortaleçam esta construção social. A industrialização da cultura não respeita
este tempo de estruturação e passa a produzir uma cultura a ser consumida,
mercantilizada. E objetiva, em uma única geração, a consolidação de sua proposta
comportamental por meio de mercadorias que caracterizam e definam o sujeito
social, como música, moda, filmes. Assim, no senso comum, a cultura é
facilmente confundida com arte.
A arte é uma
manifestação exclusivamente humana, assim como a cultura, e por meio dela
faz-se cultura. Como uma expressão do sujeito, a arte torna possível a
construção objetiva, palpável, de sentimentos e condições subjetivas, sensações
que todos os humanos reconhecem, mas poucos conseguem objetivar em palavras,
formas, sons ou movimentos. Como saudade, amor, raiva... Todas estas palavras
são códigos para que consigamos nos entender, foram criadas a partir de
manifestações que buscavam definições para o que humano sente. Culturalmente
elas se fortaleceram em nossa sociedade, tornando-se códigos comuns, mas
artisticamente elas nunca serão definidas, determinadas a uma única
manifestação, ampliando possibilidade de entendimentos.
A Indústria Cultural
assume então a produção artística, e fazedores de arte para o mercado consumidor,
criam peças que dialogam com nossas angustias, com nosso vazio, com nossas
insatisfações, provocando uma rápida identificação ao ser humano que busca
respostas para suas subjetividades. Vale lembrar que vivemos em uma realidade
que não nos permite tempo e espaço para a produção artística que concretize
nossas subjetividades, então saciamos esta necessidade numa busca externa. Nosso
trabalho limita-se em atividades repetitivas cuja produção não nos pertencem e
nosso tempo fora dos empregos são consumidos por mercadorias que são vendidas
para nosso entretenimento, ou melhor, distração. A indústria cria momentos para
que não precisemos pensar, afinal, trabalhamos a semana inteira e merecemos
descansar! Este ritmo de vida imposto é resultado desta indústria que,
vinculada à criação de nichos de mercado, de novas necessidades, constrói novos
comportamentos sociais, ou seja, constrói cultura.
Se a cultura é uma
construção natural do ser humano e passa a ser industrializada para ser
consumida, ela deixa de ser um produto resultado de um trabalho para ser
mercadoria resultado de um emprego! A cooptação da produção artística pelas
rédeas do capitalismo provoca uma hegemonia cultural, onde o mercado
mundializado cria e atende demandas por todo o planeta, tornando “natural” as
mesmas formas de se comportar, se vestir, se alimentar... Podendo causar ao
longo da história um genocídio cultural, descaracterizando povos que são
julgados atrasados, não civilizados e causando nos sujeitos um processo de
desaculturação. Para que esta cultura do capitalismo, do consumo, do
fortalecimento de subjetividades individuais que parecem saciadas na compra de
mercadorias seja compreendida como natural, é imprescindível que outras
instituições participem desta construção cultural.
Quando a educação
institucional passa a ser obrigatória ao termino da chamada primeira infância
compreende-se o valor desta educação para a formação do sujeito social. É lá,
na escola, que aprendemos os valores alimentados em sociedade, como se
comportar, como se relacionar, como trabalhar... E ao longo deste processo
educativo saímos prontos para dar continuidade a esta cultura depois de doze
anos.
A formação de professores
e pedagogos atende a esta necessidade de hegemonia cultural, fortalecendo
padrões de comportamento por meio de sujeito frutos da Indústria Cultural, que
inibe a criatividade humana, a produção artística do sujeito limitando sua
forma de comunicação. A arte passa a ser distanciada, reconhecida num mercado
fechado e especifico de atuação. E o possível interesse da juventude em se
desenvolver artisticamente fica estruturado à fama, reconhecimento e sucesso,
subjetividades que são frutos culturais da hegemonia do capital.
Professores e
educadores que fortalecem esta ideologia acreditam ser imparciais no processo
de ensino proposto, pois como fruto desta cultura do capital, eles entendem o
comportamento de adaptação e valores sociais (apoiados na subjetividade do indivíduo) como naturais ao ser humano, e obedecem às regras como movimentos
orgânicos da sociedade. Produtos de uma educação privatizada, de ideologia
neoliberal, estes profissionais são formados de acordo com a demanda de
mercado, e não com qualquer intuito de questionar a realidade capitalista. Ideologicamente
devem contribuir com a formação do sujeito para que ele tenha uma boa profissão
e conquiste bens materiais e sucesso, estruturas para o conceito de felicidade
da cultura do capital. Palavras definidas pela Indústria Cultural ao “fazer”
artistas que expressem o que precisamos saber para nos manter socialmente
equilibrados.
Toda naturalização
desta cultura produz intelectuais e artistas orgânicos na manutenção desta
ideologia. Segundo os autores da obra “Brevíssima Introdução à Sociologia
Crítica”, a Ideologia é o discurso que mascara os verdadeiros interesses do indivíduo, que surge por meio de suas ações. É quando o professor explicita sua
preocupação em relação ao desenvolvimento da criança, mas a proíbe de desenhar
livremente ou pintar o mar de rosa. Este exemplo aplicado à educação infantil
demonstra que o verdadeiro interesse do profissional é adaptar a criança à
realidade, e não desenvolver seu potencial. E esta ação aparentemente
incoerente não faz do professor um sujeito maldoso, mas um sujeito tomado pelos
valores da Ideologia dominante que dita o certo e o errado, o que pode e o que
não pode, o que é arte e o que não é. Assim como alguém que almeja em ser
reconhecido como artista sofre com a exigência do mercado que propõe a
adaptação de sua obra para que seja reconhecida como arte e atenda uma demanda
ou nicho especifico de consumidores. Perde-se aí a honestidade do produto por
meio de um processo mercadológico.
A Ideologia dominante
não é reconhecida enquanto ideologia na cultura do capital. É naturalizada como
comportamento humano. Qualquer outro discurso que questione esta ideologia é
reconhecido pejorativamente como ideologia, construindo assim uma ideia comum
de que ideologia refere-se a ideais utópicos, sem fundamentos, radicais e
subversivos. Mas na sociologia, ciência que parte do senso comum para
construção sólida de conceitos, esta compreensão divide-se em duas grandes
teorias ou correntes de pensamentos sociológicos. Uma, inserida e de acordo com
a ideologia do capital, naturalizando à condição social humana e valorizando
conquistas individuais e outra que questiona esta naturalização e possibilita a
imaginação, a criação, de uma nova realidade que compreenda e sacie as
necessidades humanas básicas, sem invenções. Uma realidade que proporcione o
uso fruto do produto àquele que o desenvolveu e não reduza sua força de
trabalho, sua humanidade, sua existência a mais uma mercadoria à venda.