Páginas

Ensaio Reticom

Ensaio Reticom

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Com um pouco de coragem, silêncio não é omissão.

Há uma luz que conforta, aquece, queima, arde, arranca, rasga, expõe...
Aquilo que te faz amar, quando te faz engolir desrespeito, te faz questionar.
Questionar a si mesmo, o que se ama, o que se aceita...
"A paz que eu não quero para ser feliz" é aceitar por convívio social ou consideração, falas e comportamento que julgo o atraso da revolução mental, e consequentemente social, do ser humano.
O egoísmo, a ganância, o ódio, a intolerância.
Penso e repenso meus defeitos e sombras quando lembro quanto amor cultivo àqueles que agem de forma, ao meu ver, errada. Ao meu ponto de vista, posso lembrar de aceitar o tempo, as referências, a semiótica de cada um. Mas ao me sentir desrespeitada, ameaçada, confrontada, não cabe mais ao tempo do outro minha calma e paciência. Cabe ao meu questionamento quais são os valores que posso manter, melhorar e cultivar em mim daqui por diante.
Há algum tempo fingi não ouvir comentários racistas, reacionários, preconceituosos por virem daqueles que eu amava, daqueles que me recebiam. Hoje entendo que a barbárie se planta aí. Nestas palavras do próximo e no meu silêncio. Na minha presença omissa no cultivo do ódio, onde minhas lágrimas de indignação alimentam a distância da paz. E que o amor morre na mesma condição, quando o que se um dia admirou se dissolve em atos mesclados de familiaridade.
Se o amor prevalece, trabalhamos juntos na transformação de ambos. Mas não é possível transformar sozinho.
Não da pra deixar de amar com a mesma intensidade e velocidade que uma surpresa indigna, mas é possível sentir, quando passou, que um pouquinho de amor acabou. Vazando com o que um dia nasceu da admiração, da cumplicidade, da humildade, da troca... quando tudo evapora, percebe-se o amor tão isolado, em partículas tão pequenas, que qualquer vento o faz perder o sentido. É uma morte dupla!

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

O silêncio do carnaval, as cores que ficaram, as máscaras que voltam

A cidade voltou a respirar seus ritmos frenéticos. Sua pulsação de construção, a indiferença de seu cinza...
A alegria em acordar, o sorriso ao olhar o próximo, a simpatia, paciência e euforia foram guardadas com a fantasia. Voltamos ao olhares de tédio entre filas de carros, rostos perdidos no trânsito de pessoas que buscam por conforto em meio ao que desconforta.

Foram dias em que árvores em V, estupradas pelos fios, me soaram mais verdes.
A força de suas raízes que empurram o concreto, lutando pela liberdade natural de Ser... Liberdade que lhes fora privada. Que fé e força há nestas árvores urbanas, que acariciam meus cabelos quando sorriu ao céu... É uma das mãos de Cernunnos, que abençoa àqueles que ainda sorriem ao seu lar, ao seu corpo. Toco seu tronco me permitindo que a firmeza de sustentação abençoe a minha gana de usufruir da força da gravidade, para manter-me pra cima, entregue ao vento.

Acabaram as marchinhas, o brilho, o amor sem limites
Fica a ressaca e o tédio do normal, à tudo que volta a ser como era...
Uma transformação fictícia, de fantasia postiça, que não têm força para esconder a armadura há tempos fundida, enraizada...  como concreto que priva as as raízes de respirar a terra.

Sigo meu carnaval, que cessou por alguns dias, quando outros quiseram pular
Sigo pulando e cantando, jogando purpurina em caminhos abafados
Sigo me montando todos os dias, recebendo risos quebrados, de ofensas ou de beleza
Sigo acreditando na música que a natureza me canta todos os dias, destacando-se do barulho confuso que o homem faz.
Sigo sorrindo aos estranhos, acenando aos irritados, lutando como às arvores que querem manter-se seguras e livres em seus próprios lugares. Acariciando cabelos, permitindo toques, trocando amores pulverizados em olhares distantes... nos olhar longínquos de suas próprias raízes, que estranham suas próprias vontades.

Aqui, só começou de novo!!

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

dilui-se

Há algo pesado no ar
Com uma necessidade gritante de se dissolver
Deixar dissipar e em seus pedaços se perder
Sem o tédio do ridículo medo de sofrer

Há de se deixar pesar
Aquilo que é meu e devo carregar
Diluo no álcool partículas isoladas
Isolando o que não se pode (ainda) transformar

Me assola outras dores
afim de inferiorizar meus pavores
Me bate na cara a ironia
De ter criado meus próprios horrores

Acomodada, dou colo a mim mesma
Sofrendo de solidão inventada,
Clamando por situações criadas...

Entre meu direito de bagunçar o meu eu
E pedir ao externo que me acompanhe...
Isolo a festa cega entre pão e champanhe

...






segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

No Inferno Astral

A doce sensação de se permitir àquele leve depressão quase cênica, que condensa o tempo e o espaço. Que permite à delícia de uma dor quase escolhida, o peso das lágrimas alcançadas.

O céu se divide entre o azul mais vivo que meus olhos alcançaram e o cinza úmido mais cabível ao momento buscado.
O vento coreografa as folhas que as árvores se desfizeram e permite-me como espectadora de um dos mais belos espetáculos de dança, que alcança o tato, o olfato, a audição... quase num convite ao tempo para que deixe de ser linear.

E neste envolvente espiral me reencontro comigo mudada, num tempo que passa e me retorna presentes.
Na delícia de repensar no que foi vivido em 29 anos, avaliar o que construí dentro e fora de mim, não há necessidade de fuga frente ao aperto que começa de dentro, no centro.

A doce depressão quase cênica, com trilha sonora adequada, vozes rachadas... chuva, livro e filme que embargam a ânsia de uma alegria infantil, adiando e preparando novos conteúdos e estruturas que construam  uma nova felicidade.

Me permiti, antes de gozar do inferno, vomitar palavras sem nexo, sem a beleza da prolixidade ou das doces confusões metafóricas. Há textos que transmitem minha perdição num tempo sem controle até que cesse em mim o desejo de boiar na areia movediça, que envolve, abraça, conforta...

A doce sensação de depressão quase cênica do meu inferno astral.
Acredito quando faço acontecer. Me delicio quando perco controle do tempo que me joga de volta pra mim...

Eu vou voltar. Mudada, mas sem deixar de ser eu em busca de mim.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Acordei gorda!

Sabe quando a gente cede para as futilidades?
Acordei depressiva em pôr qualquer roupa para sair na rua. Acordei de mal com o espelho, lamentando minha barriga, minha bunda, minhas pernas...

A estupidez deste padrão de beleza é tão grande quanto sua força.
Permitimos olhar-nos e lamentar nosso corpo, quando deveríamos ter gratidão, por termos plena capacidade física e mental, para realizarmos tudo aquilo que realizamos no dia a dia.

Vejo crianças tão pequenas sofrendo por não atenderem um padrão imposto de beleza.
Por não serem magras, loiras, altas... Meninas de 15, 16 anos que sonham em fazer plásticas para alterar seu corpo, pois não são perfeitos. (??)
O imediatismo exige rótulos bonitos para que sejamos bem aceitos.
Falta-nos criar tempo para criarmos pessoas dentro destes rótulos.

Como a roupa que visto ou o tamanho da minha barriga pode incomodar ou impactar mais do que aquilo que falo ou faço?
As pessoas vêem mais fotos no facebook do que leem os blogs!
Nós construímos este valor e nos prendemos à ele, nos engrunhando num nó de depressão, solidão e  insatisfação. E deixamos que nossos pesos nos importem mais do que situações sociais inaceitáveis.

Nos limitamos a aparições externas. Viramos produtos de uma sociedade fruto farto da revolução industrial. Somo educados por marketeiros, cujo formato da embalagem e o rótulo deve desviar a atenção do conteúdo. Às embalagens feias não têm demanda!
Concorremos com a gente mesmo numa guerra fútil para uma beleza externa, e deixamo-nos cada vez mais vazios...
Vejo preocupações alimentícias focadas nas calorias, não nos nomes estranhos que mal identificamos, ou na origem e processo daquilo que chamamos de alimento.

Esta escolha por rótulos, escolha por sermos rótulos, contribui para outros comportamento ocos, como escolher um cachorro pela raça. Passamos a ser controlados pelo gosto imposto. Não temos mais certeza se gostamos do que gostamos, ou se gostamos para que os outros gostem da gente. Nos deparamos então, com uma sociedade farta de pessoas que agem previsivelmente, se afastando de si mesmo para poder se querida por outros que mal se conhecem.
Nosso comportamento social pode ser limitado ao Facebook. Um mundo de aparências, onde todos leem Nietchszie, todos amam animais, todos são belos e bonitos. Mas esta propaganda de margarina acaba assim que falta luz. No escuro, podemos nos mostrar monstros egoístas, que roubam e depredam, ações que gritam aquilo que a gente esconde.

Que difícil é encarar o mundo para aceitar ser você.
Pois escolho que minha embalagem será transparente, com rótulos diversos que as vezes vão agradar, outras não. Que as vezes vão enganar sobre o conteúdo. Que as vezes vão afastar, e outras, criar demanda.
Escolho ser mais fiel e exigente no que me preenche, no que me recheia.

Num mundo, como um grande mercado, produto sem rótulo não vende.